“Dívida da autarquia atinge os cinco milhões de euros” Rui Silva, presidente da Câmara de Figueiró dos Vinhos, afirma que a dívida de cinco milhões de euros do município está controlada e que não irá prejudicar alguns dos compromissos eleitorais assumidos em 2005. O desenvolvimento económico do concelho em várias vertentes é uma das apostas da autarquia, como medida para captar mais investimento privado. O autarca critica o anterior executivo liderado por Fernando Manata, por ter descurado a vertente económica. Em entrevista, Rui Silva defende que a regionalização poderia dar mais força à zona Centro do País e contribuir para o desenvolvimento dos concelhos do Pinhal Interior
Diário de Leiria (DL) - Conseguiu ganhar uma autarquia tradicionalmente PS. O que esteve na origem dessa vitória?
Rui Silva (RS) - O que esteve na origem da vitória foi uma luta democrática que travei com um grupo de pessoas independentes e outras militantes do PSD, como uma vontade enorme de fazerem alguma coisa pelo concelho de Figueiró dos Vinhos, e, no fundo, é o corolário de uma luta que travámos há cerca de 15 anos. Devo dizer que perdi três vezes. Em 1993 integrei a lista em terceiro lugar, em 1997 em segundo e em 2001 em primeiro. Perdemos estes embates eleitorais, mas sempre a subir na votação. Como a democracia é o melhor sistema político que se conhece e a alternância democrática é de salutar, em 2005 o povo figueiroense entendeu que depois de 16 anos de trabalho do PS, que fez coisas bem feitas, deu-nos a oportunidade para demonstrarmos que também somos capazes de o fazer. Estou certo que no final do mandato saberemos responder perante os figueiroenses sobre aquilo que fizemos.
DL - Como encontrou a autarquia em termos financeiros?
RS - Em termos de dívida a curto/médio prazo, ou seja, a empreiteiros e à banca, atingia os cinco milhões de euros. Para saldar essa dívida era necessário um ano e três meses sem pagar os vencimentos aos funcionários e não fazer qualquer obra.Conheço municípios que em termos financeiros a situação está descontrolada, mas existem outros francamente mais desafogados em termos financeiros.
DL - Face a essa dívida, como tem conseguido fazer a gestão do município?
RS - Como ainda temos alguma capacidade de endividamento, recorremos à banca e dilatámos os prazos de alguns empréstimos. Uma câmara municipal tem que ser gerida como uma empresa, e, como a lei nos facilita dilatar os prazos de amortização, alargámos o prazo de pagamento dos empréstimos mais significativos de oito para 20 anos, o que nos deu algum desafogo financeiro. Para além disso, durante a campanha eleitoral comprometemo-nos aumentar as verbas destinadas às juntas de freguesia, que continuam a ser o parente pobre da democracia. Por isso mesmo, decidimos atribuir-lhes o mesmo valor que recebem da administração central. Dada a difícil situação financeira da autarquia é um esforço muito grande, mas é uma forma de descentralizarmos meios e competências para as juntas de freguesia, porque com essas verbas podem executar os trabalhos mais baratos e deixar os mais estruturantes para o desenvolvimento do concelho a cargo da autarquia.Acreditamos nas juntas de freguesia, independentemente da cor política, e estou certo que o trabalho se vai desenvolvendo de uma maneira mais descentralizada e mais justa.
DL - O valor da dívida pode impedir a concretização de compromissos assumidos durante a campanha eleitoral?
RS - A dívida existe e atinge os cinco milhões de euros, mas com o Quadro de Referência e Estratégia Nacional (QREN) estou convencido que vamos conseguir levar por diante o que prometemos ao eleitorado.“Saneamento é uma das bandeiras”
DL - Falou em projectos estruturantes para o concelho. Que projectos são esses?
RS - Queremos aproveitar as verbas do QREN e os contratos-programa que iremos celebrar com o Governo para aumentarmos a taxa de cobertura da rede de saneamento básico no concelho, que neste momento ronda os 25 por cento. Há hipóteses, através da empresa Águas do Centro, de darmos um empurrão nessa área com alguns projectos que vêm do anterior executivo. Efectivamente, o saneamento básico é uma das nossas bandeiras. Além do saneamento básico, a falta de emprego é um problema transversal à sociedade portuguesa e Figueiró não foge à regra. Já residiram 13 mil pessoas no concelho, mas actualmente a população residente ronda os 7 500 habitantes. Estamos a conseguir estancar a imigração para outras zonas. Embora Figueiró dos Vinhos não tenha tido muita vocação para a indústria, tem um parque industrial que queremos reconvertê-lo em parque empresarial. Actualmente só é permitida a instalação de indústrias naquela zona, mas estamos a alterar o fim para possibilitar a abertura de lojas comerciais e de serviços . É uma forma das micro-empresas se poderem instalar. Há uma vontade enorme de avançarmos com o processo, mas ainda não conseguimos por questões burocráticas. Os municípios de Castanheira de Pera, Figueiró dos Vinhos e Pedrógão Grande estão empenhados em construir um Parque Empresarial com dimensão para poder servir de alavanca para o Norte do distrito.A nível urbanístico queremos um concelho adaptado ao século XXI. Começámos a construção de uma avenida de acesso à Zona Industrial da Ladeira da Calça, que permite o acesso ao futuro Intermarché, e que é o pontapé de partida para alargar os horizontes de Figueiró. Queremos requalificar a Avenida José Malhoa, que permitirá o acesso ao edifício do Pólo de Formação do Instituto de Formação Profissional de Leiria (IEFP). Com a vinda de duas médias superfícies, está prevista a requalificação urbana do Centro Histórico, que irá beneficiar o comércio tradicional.
DL - Acredita que esses projectos podem ser executados durante o corrente mandato?
RS - A maioria destes projectos são para executar até Outubro de 2009. O único que não é possível executar na sua totalidade é a rede de saneamento básico, porque é uma obra para ser feita durante a vigência do QREN, ou seja, até 2013. Defensor da regionalização
DL - Quais foram as principais carências que identificou quando assumiu a presidência?
RS - A principal carência é o desemprego. Podemos resolver o problema através da criação de parques empresariais, colocando à venda os terrenos a preços simbólicos, e dar uma outra dinâmica ao Gabinete de Apoio ao Desenvolvimento Local (GADL), no sentido de apoiarem a fixação de empresas, e fazer ver às pessoas que nos concelhos do interior há qualidade de vida. Num estudo elaborado recentemente por uma empresa, o concelho de Figueiró encontra-se na sétima posição no distrito em termos de eficácia de gestão municipal e na 96ª posição a nível nacional. No índice de investimento municipal ocupamos o segundo lugar a nível distrital e no serviço de apoio às populações estamos no quarto lugar.No que respeita à questão ambiental estamos em primeiro lugar no distrito e em sétimo a nível nacional, num universo de 308 autarquias. Isto tudo para dizer que em termos de qualidade de vida, nas áreas ambientais e de segurança dá gosto viver nos municípios do interior.Estamos a 45 minutos de Leiria, a 35 de Coimbra e, desde que haja hipóteses das pessoas trabalharem no interior, vale a pena continuar a apostar nestas zonas. Para além disso, há um grande espírito de solidariedade entre os municípios do interior. Este ano a Praia Fluvial Ana de Aviz recebeu, pelo segundo ano consecutivo, a Bandeira Azul, uma vez que só foram atribuídas seis a municípios do interior. Isto é sinal de que vale a pena apostar no Interior devido à boa qualidade de vida Tal como acontece, por exemplo em Espanha, mais tarde ou mais cedo a regionalização tem de ser uma realidade. Por outro lado, temos de dar uma oportunidade aos jovens de chegarem mais cedo a cargos de responsabilidade nas autarquias e no Governo, e adoptarmos uma atitude de trabalho e seriedade, que nos é reconhecida no estrangeiro.
DL - De que forma é que a regionalização poderia resolver determinados problemas?
RS - Há um mês estive num encontro em Cáceres, Espanha, e verifiquei a dinâmica e o poder de decisão que as regiões têm. As cinco regiões plano em Portugal (Norte, Centro Lisboa, Alentejo e Algarve) com umas ligeiras adaptações poderiam resolver algumas coisas. Nos últimos 30 anos, Espanha mudou quatro vezes de Governo e nós mudámos 17. Os municípios já perceberam que só com parcerias é que conseguem resolver os problemas, mas as sucessivas mudanças de Governo não beneficiam as autarquias. Isto não nos leva a lado nenhum. Em Portugal tem-se pensando muito em sobreviver às sucessivas eleições, mas estamos a hipotecar o futuro. Se tivermos a coragem de enfrentar a regionalização, a Zona Centro terá outra força. Um País virado apenas para o Litoral, ainda por cima de costas para Espanha, torna-se mais difícil encarar o futuro.
DL - A acessibilidades são as suficientes para permitir uma maior aproximação entre o Litoral e os concelhos do Pinhal Interior?
RS - Há 15 anos que anda a ser falada a construção do IC8 entre a Figueira da Foz e Castelo Branco. As zonas entre Avelar e Pombal e Proença-a Nova e a A23 não têm nada de IC8. Temos tido sucessivas reuniões para a construção do IC3, vamos passar à fase de definição do traçado final, e só há duas hipóteses: ou passa na zona de Figueiró ou na zona de Avelar. Independentemente de ser uma ou a outra solução, é urgente que se defina e que o IC3 entre Tomar e Coimbra seja uma realidade, para que esta região fique cada vez mais próxima do litoral e de Espanha. Aliás, os espanhóis têm algumas estradas à espera que Portugal construa vias de acesso ao interior do País. PDM é um problema
DL - O Plano Director Municipal tem prejudicado o desenvolvimento do concelho?
RS - O Plano Director Municipal (PDM) é um problema e ainda bem que o Governo está apostar na simplificação destes planos. A revisão do PDM de Figueiró dos Vinhos e de outros concelhos vizinhos está em curso há cinco anos. Muitas vezes diz-se que a culpa é das autarquias e de outras instituições. Não interessa saber de quem é a culpa pelo atraso, o importante é que o processo de revisão seja abreviado, porque não se percebe a morosidade destes processos, que acabam por inviabilizar a execução de alguns projectos estruturantes para o concelho.Na freguesia da Aguda, por exemplo, alguns casais novos que se querem fixar não o podem fazer, porque quase todo o território está classificado como Zona Florestal. Muitos deles constroem em concelhos vizinhos e vejo-me impotente para evitar essa deslocalização das pessoas, e que acaba por contribuir para a desertificação das freguesias.
DL - Como acompanhou o desenvolvimento de Figueiró dos Vinhos nos últimos 20 anos?
RS - Na área social, cultural e desportivo fez-se um bom trabalho, mas na vertente do desenvolvimento económico pouco ou nada foi feito e em termos urbanísticos o concelho parou no tempo. Quem cá esteve fez coisas boas e outras menos boas, mas temos de apostar mais na área económica, quer na criação de espaços empresariais quer na revitalização do comércio tradicional. A prova disso, é que há dois anos Figueiró dos Vinhos estava em último lugar a nível distrital nos índices de poder de compra. Estamos inseridos num mercado aberto e temos que colocar definitivamente o concelho no mapa. Se apostarmos no desenvolvimento económico, mais tarde ou mais cedo a verdade vem ao de cima. Agora que não nos peçam para fazer num ano ou em dois o que não se fez em 20 anos, porque milagres só em Fátima e o último foi há 90 anos.
DL - Que balanço faz deste ano e meio de mandato?
RS - Um balanço positivo. Não digo que esteja tudo bem, mas implementámos a rede de novas tecnologias no concelho, o sistema de gestão da qualidade do município para servir as pessoas cada vez melhor. Outra aposta nossa passa pelo reforço do desenvolvimento cultural do concelho. No próximo ano queremos celebrar os 75 anos da morte de José Malhoa e, neste âmbito, estamos a tentar implementar a Rota de Malhoa, para que possa ser mais uma alavanca no sentido de colocar Figueiró dos Vinhos no mapa.
fonte: Diário de Leiria - http://www.diarioleiria.pt/12126.htm